sábado, 10 de abril de 2010

Corrupção nas autarquias

Segundo o artigo de Ana Sá Lopes e Cláudia Garcia no «ionline» de hoje as «Autarquias concentram quase 90% da corrupção em Portugal», como diz estudo sobre corrupção participada no país que identificou a origem do mal: poder local. Segundo o mesmo, os homens são mais corruptos que as mulheres.

"Uma das maneiras mais simples de combater a corrupção é não votar em determinados candidatos", diz Luís de Sousa, professor do ISCTE e autor do estudo sobre corrupção em Portugal, que foi promovido pela Procuradoria-Geral da República. Apresentado ontem em Lisboa, com a presença do líder do Ministério Público, Pinto Monteiro, e do ministro da Justiça, Alberto Martins, o estudo revela que quase 90% da corrupção participada envolve os órgãos de poder local: 68,9% dos crimes de corrupção passiva são cometidos nas câmaras municipais, 15,6% nas empresas municipais e 4,4% nas freguesias.

O procurador-geral da República apelou ontem à participação do governo para garantir aos órgãos de polícia criminal os meios necessários para evitar que os processos se "continuem arrastar". Mas, para o presidente do Tribunal de Contas, Guilherme d'Oliveira Martins, a solução para a corrupção em Portugal "está na descentralização".

O estudo realizado pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) em parceria com Centro de Investigação e Estudos de Sociologia, do ISCTE, mostra a disparidade dos resultados entre Norte e Sul. Dos 838 processos que foram analisados entre 2004 e 2008, 173 dos crimes de corrupção dizem respeito ao Porto, mais 73 do que em Lisboa. No crime de peculato, a capital do tem vantagem: 105 contra 75 no Porto. Participação económica em negócio regista o menor número de incidências: 21 para o Porto e 11 para Lisboa. As diferenças entre as duas principais cidades do país podem ter várias interpretações. António Lobo Xavier avisa: "Pode querer dizer que, no Porto, a população é mais participativa nas denúncias". O advogado e gestor da Sonaecom defende que há uma grande desconfiança dos portugueses na justiça. E, portanto, "pode haver mais confiança cívica no Porto".

Os números relativos às denúncias elevam o problema a uma escala maior. No crime de peculato, praticado na grande maioria por políticos (27,9%), as denuncias acontecem no próprio local de trabalho, mas só 19,6% dos denunciantes se identificam. "Há dificuldade em encontrar elementos provatórios", explicou Luís de Sousa. O problema reside na legislação que não prevê garantias de protecção a quem emite a acusação, mas "exige que ela seja feita por escrito ou presencialmente". No caso de crimes de corrupção, 37, 5% das acusações são anónimas. E são, na sua maioria, arquivadas", diz o professor. Já na participação económica em negócio, as denúncias advêm em 42,6% de terceiros anónimos, o que é justificado pelo interesse do "terceiro" no negócio, afirma Luís de Sousa.

A origem da corrupção é, para Lobo Xavier, muito clara: "O financiamento ilegal dos partidos, a crise económica e a redução de obstáculos jurídicos". Já a procuradora da República, Helena Fazenda, recorda que "as leis se sobrepõem, entram em choque e criam insegurança jurídica" na hora de determinar soluções. Oliveira Martins, presidente do Tribunal de Contas, assegura que as sanções "aumentaram significativamente desde 2006". Porém, 53,1% dos processos foram arquivados.

Estão ainda em investigação 30,3% dos casos e apenas 6,9% resultaram em condenação. "Não há inocentes no processo da Justiça. "Toda a gente tem a sua quota parte da culpa", diz Pinto Monteiro. "A corrupção é uma questão de oportunidades políticas e económicas e a atitude punitiva que a sociedade pede não é o único caminho", adianta Lobo Xavier.

O caminho, para Oliveira Martins, é apenas um e está mais próximo do cidadão do que ele suspeita: "Evitando um pequeno favor, algo que parece comum na sociedade, mas que também é crime", diz o presidente do Tribunal de Contas. Porém, recorda que as transformações são lentas e "exigem grande determinação de todos".

A participação feminina na corrupção é "desprezível": cerca de 20% para 80% dos homens. "Os números acompanham a dificuldades das mulheres em ascenderem aos cargos superiores". O estudo não permite fazer um retrato robot do corruptor, mas dá algumas pistas: é um indivíduo casado, entre os 36 e os 50 anos, que exerce uma função a tempo inteiro com vínculo contratual definitivo. Lobo Xavier traça outro perfil para o político dos negócios: "Esse homem é difícil de apanhar, muitas vezes é consultor ou advogado".

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